quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Trilha Salkantay - Dias 1 e 2

Quando finalmente compramos as nossas passagens de  avião e decidimos reservar a tradicional trilha Inca, eis que esta - limitada pelo governo do Peru com quantidade máxima de pessoas permitida por dia na trilha - já estava esgotada, mesmo com 3 meses de antecedência!!
Não tendo mais como mudar as datas, tivemos que achar um plano B. Entre outras trilhas oferecidas, depois de ler muitos relatos e muitas trocas de email com as agências de turismo, ficamos com o Camino Salkantay e com a Alpaca Expeditions.

Diferentemente da Trilha Inca, que normalmente tem duração de 4 dias, a Salkantay tem 5, o último dia é Machu Picchu. Então como os dias eram longos, dividi o percurso em 3 posts. 

A odisséia começa ainda em casa, quando temos que fazer as malas pra tamanha aventura. A pressão é grande, afinal botas erradas podem arruinar todo o "passeio" e botas certas, fazem uma grande diferença!! Já li que algumas pessoas fazem a trilha de tênis e inclusive tivemos um rabino-sul-africano-aventureiro que deu conta do recado em jeans e tênis, mas afirmo que ele era um ser iluminado!! Botas de hike são caras, mas vai por mim, você vai agradecer os trocados a mais quando estiver descendo as pedras deslizantes, ou num dia de chuva onde a lama se mistura aos excrementos de cavalo pelo caminho...
A regra também é testar a mochila antes e levar o mínimo de bagagem possível. No melhor estilo "faz o que eu digo não faz o que eu fiz", pois horas antes de sair pra trilha, vi que simplesmente não cabia NADA na mochila que levei e graças a Deus, meu gringo tinha levado a que ele usa no dia-a-dia e foi com ela que fui, dei conta, mas sofri muito com dores nas costas pois claramente ela não era feita para o tal!
Em boa parte dessa trilha são permitidos cavalos e são eles que carregam as bolsas com a maioria das nossas coisas, o resto, do que será usado no mesmo dia - como água, lanchinhos, câmera, casaco  e calça a prova d'agua, poncho pra chuva e etc - nós é quem carregamos. 




Minha packing list:
- 1 bota de trilha cano alto Hanwag (considere cano alto se tiver problemas no tornozelo)
- 1 tênis (alguns dias faz calor, é possível fazer o caminho de tênis e é necessário dar um descanso para os pés)
-  Havaianas
-  5 calças leggings (se preferir, use calça de hike, dessas que se separa a barra e vira short) *separe pelo o menos uma muda de roupa limpa para o último dia
-  2 blusas manga curta
-  2 blusas manga comprida (dessas de tecido respirável, feita para esportes)
-  1 fleece (casaco de plush)
-  1 casaco de chuva 
-  1 calça à prova d'água 
-  1 casaco forte para os dias de frio (levei meu casaco de snowboard)
- 5 pares de meias de hike (são bem grossas e diminuem o atrito, além de proporcionar um acolchoamento a mais)
- 2 meias de seda próprias para serem usadas junto com a meia de hike (tem gente que não usou e não teve problemas de bolhas, eu, como tava morrendo de medo delas, usei e deu tudo certo!)
- Kit de primeiros socorros (band-aid, antisséptico, remédios, etc)
- Câmera e carregador extra ou bateria extra
- Gorro,  luva e cachecol (o primeiro dia de trilha e a primeira noite fazem bastante frio)
- Camelback ("saco" especial para armazenamento de água)
- Óculos escuros 
- Bikini (existe a possibilidade de visitar as termas no 2° dia)
- Boné 
- Kit de higiene básico (papel higiênico, desodorante, shampoo, lencinho umedecido e etc)
- Repelente de mosquitos
- Lâmpada de cabeça e/ou lanterna 
- Toalha
- Tornozeleira (não usei, pois a bota de cano alto é ótima, mas levei por precaução)
- Lanchinhos (apesar deles sempre disponibilizarem lanches para levarmos ao fim de cada refeição, tenha umas barras de cereal e energia para quando se sentir mais fraco)
- Passaporte e carteira (é necessário apresentar o passaporte na entrada de Machu Picchu e para fazer a subida de Wayna Picchu) 


1° Dia: 15km - Altitude: 4620m
O primeiro dia começa as 5 da manhã quando o grupo passa para nos pegar no hotel. 
Dali, depois de quase 4 horas saculejando em serras intermináveis na van - com paisagens muito bonitas, diga-se de passagem - chegamos ao acampamento do primeiro café-da-manhã, em Soraypampa.
Há 400m de altitude a mais do que Cusco, já começamos a sentir os efeitos do Saroche - mal de montanha. 


Rapidamente os guias e cozinheiros ajeitam um café-da-manhã - e mesa- com tudo que temos direito, como aveia, ovos mexidos, café e frutas.

 

Já não bastasse a altitude e as poucas horas dormidas, ainda bate um enjoô provocado pela subida anterior com a van. Rapidamente percebo uma distância do restante do grupo. Parece que a cada dois passos tenho que dar 5 mentalmente, a cabeça vai, mas o corpo demoooora a responder. 
Uma de nossas integrantes vomitou e ficou com pressão baixa, foi logo resgatada pelo cavalo ambulância que a levou até o acampamento do almoço.

Sem saber muito bem como, tentando admirar a paisagem - a vegetação rasteira, os cumes das montanhas cobertos de neve (cada vez que a neblina dava uma trégua) administrando a chuva e consequentemente o poncho e seu barulho chato de plástico - eis que depois de 4 horas de subida, chegamos ao acampamento do almoço, Soyrococha, a 4400m. 





Manda um balão de oxigênio aí, por favor!!!




Numa tenda que já estava montada quando chegamos lá - o que demonstra a rapidez no trabalho e subida dos carregadores/cozinheiros -  é feito e servido o almoço.
Temos sopa, arroz, frango, salada e legumes, como o milho gigante da foto, um dos tantos ingredientes característicos na culinária do Peru. 










Depois do almoço, devidamente regado a chá de coca, nosso guia aponta pra essa trilha e diz, "agora subimos só até aquele topo ali ó, onde está a Passagem Salkantay," o ponto mais alto de toda nossa trajetória, aos pés da famosa montanha. 


Claro que o "ali", não chegava nunca, acho que foi a 1 hora mais longa da minha vida. Sem exageros! Não existia mais ar no mundo pra encher meus pulmões, era uma respirada funda, dois passos e 1 minuto de descanso. 
Até por isso, não tenho fotos dessa etapa, todo meu esforço estava concentrado em chegar até a tal passagem. Todo o restante do nosso grupo (éramos 10 pessoas) já tinha estado na alta altitude da Bolívia na semana anterior e já estavam todos devidamente aclimatados.

Ao chegar verde no topo da montanha, era só alegria, principalmente porque já sabíamos que o pior já tinha passado e depois dali, era só descida.

4630 metros - o sorriso mais puro e genuíno.




Lá no topo, admiramos um pouco da vista, tiramos a foto em grupo, vimos uma avalanche acontecer na montanha, reequilibramos o fôlego e começamos a descida. 



Descemos por horas, admirando a beleza do vale a frente, até as nuvens começarem finalmente a se dissipar e nos mostrar a célebre montanha Salkantay (6260m).


Salkantay quer dizer Montanha Selvagem em Quechua, a língua dos nativos. É uma das montanhas mais famosas e imponentes da região. Apesar de ser somente a décima segunda em altura no Peru é a 2° maior proeminente topograficamente. Os incas atribuíam a grande fertilidade do vale de Machu Pichu ao alinhamento da montanha com as estrelas na época das chuvas, considerando-a assim como uma divindade, um presente ao controlar o tempo e a fertilidade. 



Fato é: na descida, todo santo ajuda, mas nem todo faz milagre!! 
As pernas já começavam a pedir arrêgo quando começou a escurecer e o acampamento não chegava nunca.  Aquela dorzinha de cabeça chata que me acompanhou durante o dia se instalou como uma bateria de escola de samba. 




Quando finalmente chegamos ao acampamento, 15km e 9 horas depois, sentei na barraca e foi incontrolável: chorei!
Chorei copiosamente de orgulho da minha resistência, de uma força que não-sei-de-onde e de dor, muita dor de cabeça!!
Ao mesmo tempo, o meu gringo, que até então tinha passado ileso a todos os efeitos da altitude, desabou ao meu lado. Não bastasse todo esse contexto, vomitei!
Pronto, já posso voltar pra casa, cansei de brincar de aventureira!!!

A equipe é muito bem preparada, nosso guia veio verificar como estávamos, nos trouxe sopa, mediu nosso nível de oxigênio no sangue (caso estivesse num nível de emergência, eles tem balão de oxigênio disponível). Antes de todos dormirem ainda trouxe compressas de água quente, que colocamos nos pés nos sacos de dormir. Invenção dos deuses pra quem dorme a 5° graus numa barraca na montanha!!

É importante ressaltar que o soroche não escolhe a quem "atacar", de 11 pessoas do nosso grupo, somente 4 foram afetadas, por grande ironia do destino, nós 4!! Todos jovens, esportistas, ativos. Rá!
Fato é que só tivemos 1 dia e meio em Cusco e o aconselhado são no mínimo 2 para aclimatização.

Infelizmente, pulamos o jantar da primeira noite, mas no meio da madrugada levantei para ir ao banheiro (leia-se: barraca com vaso no meio do nada) e quase chorei denovo, dessa vez de gratidão, ao ver as estrelas e o topo da Salkantay iluminada pela lua cheia!!! Todo o esforço é recompensado!! ;-)

2° Dia: 9km






























No dia seguinte, devidamente recuperados da dor-de-cabeça e enjôos, depois do café da manhã, com direito a salada de frutas e mingau de quinoa, começamos a descida em direção a La Playa, local do segundo acampamento. 







Neste dia a paisagem já é bem diferente, vegetação mais alta, chuva e muita lama. Já encontramos algumas comunidades no caminho e os guias vão falando da flora da região. Vemos algumas espécies de orquídea e esse sapatinho de flor - que não tenho idéia de como reproduzir o nome em quechua!



























Depois de 4 horas de uma descida muito tranquila, chegamos ao local de almoço e nos deparamos com um banquete. Aqui nosso guia falou de vários aspectos da cultura inca e da culinária peruviana.







Com as recentes chuvas na região, um grande pedaço do Camino Salkantay original, que deveríamos fazer após o almoço, estava interditada por conta de deslizamentos de terra. Então nosso guia sugeriu uma votação: andar os 10km restantes pela estrada, onde os carros passam, ou descer de Van e aproveitar a tarde nas piscinas termais de Santa Teresa. 
Nem preciso dizer que a decisão foi unânime, né?!








Assim que vi os abismos e a largura da estrada, tive certeza de que tínhamos tomado a decisão certa!!!


















Deixamos nossas mochilas no acampamento em La Playa e fomos felizes e faceiros direto pras piscinas.
A entrada custa míseros 5 soles - 5 reais - e posso assegurar que gastaria até 50!!
Não tem preço a sensação daquela água morninha nos músculos cansados dos muitos kilômetros percorridos!!

Além da água ser uma delícia - quente naturalmente mesmo - o visual do lugar é bem bonito e tem uma estrutura com chuveiro (de água fria) pra quem já quiser emendar num banho com direito a sabonete depois.

São 3 piscinas e cada uma com uma temperatura um pouco mais quente, conforme vai se aproximando da nascente/pedra.
O que mais gostei é o fato do fundo ser de pedra (rolou uma massagem nos pezitchos) e a própria escavação tem "bancos" pra gente sentar, se apoiar nas mesmas.






Algumas horinhas ali e voltamos pro acampamento, mais um banquete antes de dormir para amanhã encarar mais um dia lindo!

Leia sobre o 3° e o 4° dias aqui!


Um comentário:

  1. Salkantay trek is the alternative to the Inca Trail to Machu Picchu was recently named among the 25 best Treks in the World, by National Geographic Adventure Travel Magazine.

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